segunda-feira, 11 de março de 2013

Ode Material

Oh!, tule!, oh!, tafetá!, oh!, gorgorão -
Aqui vos convoco, oh moças,
Dos tecidos e da mulher eu canto. O meu marido
dissera-me que talvez me abandonasse - não
tinha a certeza, mas era provável, talvez - e não, não tinha nada
a ver com ela. Oh!, cetim!, oh!,
acetinado!, oh!, veludo!, oh!, filhadaputa do veludo! -
no dia do baile de gala do senhor doutor,
o folclore anual, as rendas,
as redes, disse-me que seria difícil para ela
ver-me lá, a dançar com ele,
se não me importava de não ir. E, como há
trinta anos que o armo,
mais ainda o armei - Arma, Virumque,
serapilheira, bordados a cinza! Ele a vestir
o terno e eu a ver-lhe o
sorrizinho no espelho, enquanto atava o laço;
ao fim de mais de três décadas, ganha-se alguma
afeição pelas pequenas falhas um do outro
e ficava-me bem acreditar que
nada de mau viria a existir entre nós. Metade-
metade, tinha sido o casamento,
metade-metade a sua destituição. E quando ele voltou
para casa e trocou de pele, Leitor,
dormi com ele, a pensar que isso significava
que tinha regressado, que o seu corpo falava por ele,
e enquanto falava, cantava do chão
o seu parente, o velho laçarote. Oh!, seda!,
oh!, novelo!, oh!, casulo roubado. É uma coisa que
a nossa espécie faz, não é,
tira-se o que se pode. Quando não, haveria bichos-da-seda
com caixinhas de pessoas, nas despensas, a produzir
placentas para uso das larvas, haveria
uma vaca que nos arrancaria os filhos
por nascer, e deles faria sapatos para o vitelinho.
Oh!, pijamas de peça única das crianças! Ama quando fores
amado. Oh!, dormideiro de flanela do bebé,
com fatia de tarte de cereja.
Ama só quando fores amado! Oh!, fatinho de recém-nascido
com lagarta a sorrir sobre o coração, é
proibido amar quando não somos amados.

(Sharon Olds, Stag’s Leap, 2012. Trad.: Ana Isabel Soares.
Porque ontem foi dia do senhor, seja ele qual for, seja ele qual for, o Reboliço foi ouvir ler.
Pode ler-se aqui uma das recensões, das muitas, que o livro suscitou.)